Wednesday, April 9, 2008

Pensamento do Dia

É legítimo afirmar que a desadaptação é o motor do crescimento. Se num dado momento de ontogénese uma estrutura em equilíbrio não é utilizada, se o sujeito permanece adaptado ao nível já adquirido, isso significa, ipso-facto, a paragem do crescimento.

A psicogénese, evolução de diferenciação-organização, caracteriza-se por uma série de “escalões de equilíbrio” (modos de funcionamento organizado) e de transformações, que tomam o aspecto de crises. Daí a alternância entre os sistemas de comportamento adaptados e as fases em que são predominantes as características inadaptadas. Isto é vulgar, desejável e necessário. Mas as armadilhas, os desvios, os riscos à trajectória são numerosos. Tanto maiores quanto mais vulnerável for o indivíduo. Os elementos provisoriamente desligados podem ficar relativamente isolados, ou apenas conseguirem aglomerar-se num subconjunto mal encadeado, naquilo que, por outras vias, se reconstrói. Algumas destas condutas inadaptadas que surgem em períodos de crise, podem fixar-se, cada vez mais privadas do seu sentido aparente, uma vez que tentam obter benefícios ignorados pelo próprio sujeito, mas bem reais. Finalmente, pode operar-se a reorganização de modo prejudicial, a duplo nível. Por um lado, o equilíbrio assim estabelecido pode ser mantidoà custa da absorção de grande parte da energia disponível (cuja ruptura gera catástrofes). Isto significa que o sujeito refugia-se numa esfera de actividades adaptadas, é certo, mas limitadas. Por outro lado, o sistema de comportamentos pessoais pode em si mesmo englobar condutas inadaptadas em relação às “regras do jogo” que vigoram, e estas condutas podem ser quase indestrutíveis, por indispensáveis à manutenção da coerência pessoal que o sujeito se esforça por preservar. Observa-se, em casos deste género, a inutilidade de um sistema penal que supõe poder impedir, pelo manejo de meras punições, a reprodução daquelas condutas cuja condenação foi juridicamente codificada; um sistema penal que, além do mais, ignora que a própria punição pode ser procurada, a título de verificação da coerência do sistema.

- Roger Perron

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